2007-11-22

Sicko 2: A destruição do Serviço Nacional de Saúde britânico
por John Pilger


Deitado numa cama de hospital, cumpridos e bem todos os procedimentos, com uma chávena de chá a acompanhar agradavelmente a última dose de morfina, assistimos ao que há de melhor. Por melhor, quero dizer um vislumbre de uma sociedade sem os dogmáticos histriões dos media e da política determinados a mudar a forma como pensamos. Isso é o que há de pior. Por melhor, recordo a inesquecível manifestação dos mineiros de Murton, County Durham, surgindo em meio ao nevoeiro numa fria manhã de Março, com as mulheres a desfilarem à frente, a voltarem para o fosso da mina. Não importa que tenham sido derrotados por forças superiores, eles eram os melhores.

Numa cama de hospital, provavelmente o melhor é mais corriqueiro, com pessoas a trabalhar rotineiramente, escutando, respondendo, tranquilizando. O vocabulário dessas pessoas não é o da linguagem empresarial. A sua 'produtividade' não é um artifício para o lucro. O seu empenhamento não tem uma meta a cumprir e a sua camaradagem é como uma presença, e nós passamos a fazer parte dela. O denominador comum é a humanidade e a preocupação. Que exótico que isto soa. Ligamos a televisão do hospital e deparamos com um outro mundo bizarro de "notícias", com idiotas famosos a tecerem a destruição final da sociedade.

Lá está o louco do Blair a apelar para um ataque ao Irão e o secretário da educação, Ed Balls, a vender os seus diplomas falsos, e o primeiro-ministro Gordon Brown, que acabou de receber Rupert Murdoch e Alan Greenspan, a anunciar o seu "regresso à liberdade" juntamente com as suas últimas "reformas" que são uma safadeza para com a instituição que personifica a liberdade na Grã-Bretanha: o Serviço Nacional de Saúde. Nenhum deles tem a mais pequena ligação com as pessoas que mantêm o meu hospital a funcionar. O divisor de águas na Grã-Bretanha de hoje está entre uma sociedade representada por aqueles que mantêm o Serviço de Saúde a funcionar, e a sua mutação sintetizada pelo governo trabalhista de Blair e de Brown.

No filme Sicko, de Moore, o socialista Tony Benn profetiza uma revolução na Grã-Bretanha se o SNS for abolido. Mas o Serviço de Saúde da Grã-Bretanha está a ser destruído por desgaste, e se as últimas "reformas" não forem impedidas, será tarde demais para erguer barricadas. A 5 de Outubro, o secretário da Saúde, Alan Johnson, aprovou uma lista de catorze empresas que serão consultoras e assumirão a "delegação de poderes" dos serviços do SNS. Ser-lhes-á dada a possibilidade de escolha, se não o próprio controlo, sobre quais os tratamentos que os doentes devem receber e quem é que os irá proporcionar. Elas têm garantidos lucros de muitos milhões.

Essas empresas incluem as americanas UnitedHealth, Aetna e Humana. Estas organizações totalitárias têm sido multadas muitas vezes pelo seu conhecido papel no sistema de serviços de saúde americanos. No ano passado, o director geral da UnitedHealth, William McGuire, que ganhava 125 mil de dólares por ano, demitiu-se na sequência de um escândalo de direito de opção. Em Setembro, a companhia aceitou pagar 20 mil dólares de multa "por não atender a reclamações e não responder às queixas dos doentes". A Aetna teve que pagar 120 mil dólares de indemnização depois de um júri na Califórnia a ter condenado por "má-fé, opressão e fraude". No filme Sicko, mostra-se uma analista médica da Humana a testemunhar no Congresso que provocou a morte de um homem por lhe recusar assistência para poupar o dinheiro da empresa. Todos os anos morrem cerca de 18 mil americanos porque não têm acesso aos cuidados de saúde ou porque não os podem pagar.

Estas empresas são as amigas do governo trabalhista. Simon Stevens, antigo conselheiro da política de saúde de Blair, é hoje director executivo da UnitedHealth. Julian Le Grand, que escreve no Guardian como um distinto professor, dá a sua aprovação esclarecida às "reformas" – também ele foi conselheiro de Blair.

Em Manchester, há outras "reformas" em vias de destruir os serviços do SNS para os doentes mentais. William Scott suicidou-se depois de deixar de ter o apoio de um trabalhador do SNS que tratou dele durante oito anos. O que tudo isto significa é que o SNS está a passar sub-repticiamente para a privatização. É esta a política não confessada do governo de Brown, cujas acções predadoras no exterior estão a ser copiadas internamente. Foi Brown, enquanto tesoureiro, que promoveu a desastrosa "iniciativa financeira privada" como uma artimanha para construir novos hospitais, enquanto entregava enormes lucros a companhias suas protegidas. Em consequência disso, o SNS está a ser sangrado em 700 mil libras por ano. Isto provocou uma desnecessária "crise financeira" que é o argumento do 'Ardil 22' [NT1] para permitir que apareçam mais oportunistas para se apoderem do que foi outrora a maior proeza do antigo governo trabalhista. Vamos permitir que eles se safem com isto?


01/Novembro/2007

[NT1] Na novela Catch 22, de Joseph Heller, a expressão 'Ardil 22' adquiriu um uso idiomático com o sentido de 'beco sem saída'.


Ver também: Porque eles temem Michael Moore , de John Pilger.

O original encontra-se em http://www.johnpilger.com/page.asp?partid=461

15 comentários:

Anónimo disse...

Sicko lobo e cia. Que tal terem vergonha e não fugirem ao assunto do despesismo vergonhoso em pópós.

Anónimo disse...

2-1=1

e não

2-1=3 como este anónimo de cima acredita. Falta de cultura matemática. A culpa também deve ser da câmara!

Anónimo disse...

Em resposta ao artigo, que sempre é melhor.

É que os capitalistas (que é diferente de empresários ou vulgarmente patrões) e os seus lacaios de esquerda (ou pseudo esquerda) aprenderam bem com os erros do passado.

Perceberam (e em Portugal o primeiro foi o Mário Soares para quem tem alguma memória) que o melhor não é privatizar quando a coisa funciona bem mas sim desgastar os serviços até a um nível -- adicionando serviços via seguradoras paralelos, que funcionam e são até mais baratos -- em que as pessoas nem se incomodam com a sua privatização e até agradecem.

Vão vêr o caso das estradas. Tudo vai ser melhor. Os buracos vão estar resolvidos. A qualidade e a seguranção vão aumentar. Tudo pelo melhor. E, claro, que o Estado vai pagar directamente (ao estilo SCUTS) e, com sorte, nós também com mais uns impostos indirectos autárquicos ou do género.

E, evidentemente, também e sempre com a maravilhosa salvação nacional que são os protocolos com os amigos construtores civis, esses beneméritos que só existem mesmo para salvar as contas públicas locais sempre que possível.

Até mais.

Anónimo disse...

Quanto aos pópós. Amigos, neste país já não há vergonha nenhuma em lado nenhum: nem na Esquerda nem na Direita nem no Estado de Direito e Democrático que deveríamos ser.

Que se lixe, portanto!

Anónimo disse...

Mário mude de cassete que já chega. Deve ser um homem muito angustiado.

Anónimo disse...

O Mário tem toda a razão e o Nuno Cavaco disfarçado de anónimo não engana ninguém, 2-1 = 1 volvo do sr presidente, o multiusos até sabe fazer contas para o lado que lhe convém.

Anónimo disse...

Um comunista rico, patrão e proprietário de inúmeros bens é um comunista ou é um burguês?

Ou um comunista ainda é um comunista se usar só roupa de marca e mandar comprar carros de luxo para uso "público", mas disser mal do Governo Central?

Ou um comunista é um burguês, e logo não é um comunista, se usar camisas sem colarinho e comer em restaurantes finos?

Fica-nos a dúvida do critério!

Anónimo disse...

Então e com 490 000 euros, quantas pessoas é podiam ajudar? Pessoas que não podem aceder a cuidados de saúde podiam ser ajudadas com esse dinheiro, mas não,preferiram os luxos do sr presidente e do resto da trupe. São vocês comunistas? de esquerda? defensores do povo e dos mais necessitados? Vão-se foder

Anónimo disse...

Falsos comunistas, envergonham qualquer verdadeiro comunista. Não passam duns novos ricos ou novos capitalistas.

Anónimo disse...

"Mário mude de cassete que já chega." - anónimo

Eu já só uso Blu-Ray e coisas do género. Cassete é para comunistas jurássicos com falta de imaginação e saudisismos caquéticos.

Claro que, comentários ao meu comentário a este artigo, népia. O normal. A básica ofensa pessoal.

Já agora, o meu comentário das 1:36 PM, Novembro 23, 2007 foi sacado de outro sítio (onde tinha os links) e colocado aqui em meu "nome" mas não foi por mim. Agradeço, mas para a próxima ponham os links que fica mais entendível pelo Povo.

Até mais.

Anónimo disse...

O original do comentario acima referenciado está no AVP, aqui.

Só para ficar a referência.
Não deixa é de ser piadético. Já não bastavam os falsos comentários em meu nome em vários blogs (este e o do telhado) agora até já copiam directamente. É só rir, é só rir...

Anónimo disse...

Eu copiei para que mais pessoas pudessem ler um comentário que eu achei muito bom.

Anónimo disse...

Agradecido, mas para a próxima faça a citação e ponha em seu nome que é melhor. Evita eu estar a ser potencialmente insultado e sem sequer o saber.

Até mais.

Anónimo disse...

Já agora:

"- Uma "Política (...) concretizada pelo grande capital financeiro e das grandes empresas de construção civil, nas suas múltiplas, variadas e complexas conexões, política que, simultaneamente, não responde às necessidades de habitação dos portugueses, particularmente daquelas classes e camadas sociais que são numericamente dominantes na sociedade, ao mesmo tempo que promove brutais excedentes de habitação (e também escritórios) que se encontram vagos, deixa degradar um número incalculável de fogos, muitos deles com características e interesse histórico, promove o endividamento das famílias e aumenta a nossa dependência financeira face ao exterior."

"Porque a habitação em Portugal «é bem o espelho das contradições, perversões e lógicas egoísticas e predatórias do capitalismo e das políticas de direita que lhes estão associadas», o dirigente comunista destacou ainda alguns dos problemas do sector, nomeadamente a «excessiva produção de habitações vagas/devolutas»."

in A Sul

E comparar com os últimos artigos do Banheirense.

Já não há mesmo nenhuma vergonha na cara para esta gente, nomedamente pró novel camarada João Figueiredo e pró multi-acessor-multi-cargo-político Nuno Cavaco.

Há coisas que nem a cegueira desculpa.

Até mais.

Anónimo disse...

E comparar com o que já esta construído e devoluto no Concelho da Moita (tanto em casas como em "barracões")?

E comparar com toda a especulação projectada no PDM da Moita?

E comparar com as "suas múltiplas, variadas e complexas conexões" e protocolos estranhos e amizades iníquas?

Nada? Nada mesmo? Nem uma palavra?

Essa malta do Avante e do PCP mais valia estar de boca fechada ou nem publicar tanta asneira, imoralidade e desonestidade; intelectual e da outra.

Mais a mais logo na Margem Sul e ainda por cima no Seixal onde se concretizam descaradamente e à luz do dia crimes como o da negociata mafiosa da CGD e do Benfica e os outros com os Silvas.

Até mais.