2007-05-24

Ricardo Araújo Pereira, dos Gato Fedorento, falou há tempos nisso, quando alguns criticaram a sua intervenção humorística no referendo do aborto, com pressões à RTP e ameaças ao próprio. O que inquieta mais em Portugal não é a desvergonha do grande poder mas, no essencial, do pequeno poder. Contra o grande poder há eleições, oposição, uma imprensa tendencialmente livre, mil e um procedimentos e garantias e até um Tribunal Constitucional que José Sócrates costuma faustosamente desrespeitar. Contra o pequeno poder não há nada disso. O pequeno poder pode lesar, oprimir, abusar, sacanear e arruinar com absoluta liberdade e normalidade, sem que as vítimas tenham capacidade para se defenderem. O pequeno poder é feito de governadoras civis como a de Lisboa que, exercendo uma competência que ninguém percebe porque é que tem, marcam as eleições autárquicas na data que mais favorece o partido do Governo. O pequeno poder é feito de "directoras" como a da Direcção Regional da Educação do Norte, que decidiu a suspensão preventiva (?) e a abertura de processo disciplinar contra um professor que contou uma pilhéria sobre o curso de José Sócrates. Espantosamente, neste último caso, o grande poder demite-se por inteiro de "corrigir" o pequeno poder. Não só a "directora" permanece em funções e o processo disciplinar está em curso, como a ministra da Educação recusa-se a ir ao Parlamento porque, nas palavras do seu secretário de Estado, Jorge Pedreira, "o ministério não tem de esclarecer rigorosamente nada porque não foi o ministério que introduziu o procedimento". O Sr. Jorge acha, portanto, que não é o Ministério da Educação que dirige, tutela e se tem de responsabilizar pelo que se passa dentro dos seus serviços. O pequeno poder é isto e muito mais. É, por exemplo, o tempo que se espera por documento num serviço público apenas porque falta uma assinatura de quem anda com falta de apetite; é o preço exorbitante que o construtor pode pedir por cada casa que vende porque ao banco convém sempre ter mais uma família empenhada; é aquele gajo que teima deixar o carro em segunda fila quando vai beber o café matinal nem se importando em procurar um lugar que está livre 5 metros à frente; é um tribunal que demora 12 anos a decidir que ainda é necessário uma nova sessão para julgar um tipo sem carta que espatifou o carro dele contra o de outro que vinha do trabalho. O pequeno poder é poder demais...

1 comentário:

Anónimo disse...

É a falsa democracia em que vivemos